quinta-feira, agosto 07, 2014

Se penso, logo desisto

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A propósito de uma notícia dada à estampa há poucos dias nos mídia sobre uma investigação levada a efeito por cientistas do departamento de Psicologia da Universidade de Virgínia relativamente ao acto de pensar, que oneraria a nossa tranquilidade e tendência natural para a inércia, """penso o seguinte""":

O corpo não precisa da mente para sobreviver, tal como não precisam dele as outras espécies . Na verdade, e em diferentes graus de adaptação e de especialização sobre o meio, com mais  ou menos desenvolvimento dos níveis superiores de integração de estímulos sensoriais e de eferências motoras ou com maior ou menor capacidade para gerar níveis de subjectivação, os seres vivos acabam por dar as respostas mais adequadas à sua efectiva existência e de se conduzirem de acordo apenas com o plano genésico das suas necessidades básicas: alimentação , procriação e segurança - e para fazer isso o homem não carece de mais ferramentas , para além daquelas que todas as outras espécies possuem e usam e que estão consignadas no manual de instruções genéticas do ácido desoxirribonucleico (ADN ). Ou seja: o programa.

Então para que serve a mente ? Ou melhor, aonde é que eu me situo no meio deste (des)concerto? Aonde é que eu sou, ou existo? 

Argumenta-se muitas vezes que a evolução teve como eixo central de desenvolvimento o factor cerebração crescente. Parece que a vida progrediu com o único objectivo de produzir um ser capaz de se ultrapassar a si próprio afastando-se das amarras naturais. Se por um lado a mente, ou a consciência, é considerado o fenómeno mais alucinante que alguma vez aconteceu na Biologia, com repercussões dramáticas na Biosfera, que todos conhecemos, nomeadamente na destruição significativa da paisagem - o Eden natural - e na alteração profunda que está a provocar no equilíbrio regenerador do planeta, por outro lado, a sua inigualável capacidade de subjectivação e engenho parecem comportar todos os ingredientes para um dia operar o prodígio de transcender-se, superando a sua condição material, "cumprindo assim o desígnio para o qual possa ter sido concebida". 

Mas como tentam provar alguns especialistas na área da Etiologia, a mente  parece ser mais uma excrescência absolutamente dispensável do que outra coisa qualquer mais taumatúrgica. E no que respeita à sua fantástica especialização, parece que ela não passa de uma espécie de tropismo gongórico, muito embora o  grau  de sofisticação atingindo. E, claro está, que a sentença sobre a sua indispensável importância seja ela própria produzida e advogada em causa própria, ou seja, a mente a defender-se a ela própria. 

Para confirmar este pressuposto, basta lembrar que as primeiras integrações de matéria viva atingiram a sua maturidade funcional apenas através de sistemas físico-químicos de correlação orgânica, não precisando, de todo, da existência de um sistema nervoso para se conduzirem na vida e de se possuírem a si próprias como seres independentes. Podemos replicar, no entanto, que existem graus , numa escala gradativa de níveis de aperfeiçoamento vital, tal como falava Aristóteles quando se referia às vidas vegetativa, sensitiva e intelectiva, mas de facto o substracto é o mesmo. 

Por exemplo, o comportamento e a forma como se conduz na vida um executivo da Big Apple, com formação académica superior e um elevado nível de sofisticação cultural, acaba por ser  do mesmo tipo da de um aborígene animista e analfabeto da Nova Guiné, se levarmos em consideração a satisfação do programa básico das necessidades humanas. Não importa, então, o cenário e as camadas de verniz "civilizacional" que carregam dentro de si, porque o que é mais importante é a forma homeostática como cada um resolve a sua vida ( mais equilibrada ou menos equilibrada; mais feliz ou menos feliz ). Enfim, o sistema nervoso ( a mente ) não é mais do que a especialização do protoplasma a cumprir todas as funções vitais necessárias ao exercício da  sobrevivência.

Portanto, a mente, ou melhor, o acto de pensar, para além de ser um epifenómeno que não vem acrescentar aparentemente nada ao devir biológico, quanto ao modo de sobrevivência, é sobretudo um factor de embasamento e de extenuação, porque condena o homem a esforçar-se toda a vez que tiver de dar um passo na vida . Pensar cansa, pois. Ao contrário dos animais, que têm a resposta mais ou menos programada e sempre pronta a aplicar em cada momento, por intermédio do arsenal dos instintos, o ser humano é obrigado a dar voltas ao córtex para resolver qualquer tipo de problema. Para além, obviamente, da condenação imposta de forma inquisitorial pela corrente da consciência que nos obriga involuntária e permanentemente a pensar. Que destino! 

Por último, saber aonde é que eu sou ou existo, depende do ponto de vista em que nos colocamos. Para os etiologistas, por exemplo e como se percebe, o ser que se interroga não tem validade em matéria de sobrevivência, é uma pura aberração. Logo: eu não sou. Já o solipsismo, como corrente especulativa radical no campo do idealismo, assegura de forma determinada que apenas a mente existe, sendo o corpo e a realidade um espectáculo feérico para introduzir pregnância a nossa vacuidade. Logo: eu sou tudo.