sexta-feira, maio 31, 2013

Pacheco e o " locus " da realidade

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" Só o que sabe e tem garantia do saber, se abre sem temor do saber do outro, porque está prevenido contra as hipóteses do pior colonialismo, o colonialismo mental ".

Num País como o nosso, em que a maior parte do povo vive praticamente à margem da cultura e  ignorante acerca dos mecanismos de poder; num país onde o analfabetismo virtual é uma autêntica calamidade e condição estratégica necessária  para conservar estatutos e fomentar  desigualdades;  numa sociedade assim, tão assimétrica e injusta, a existência de veículos de informação sérios e isentos constitui naturalmente uma exigência   fundamental para o equilíbrio de uma sociedade que se quer livre e democrática . E para que essa emergência se autentique e tenha um papel pedagogicamente importante no esclarecimento do povo, é necessário que haja pessoas,  tanto quanto  possível independentes e credíveis, cuja " Gravitas "  seja impenetrável a qualquer beliscadura. Estes faróis, que tentam iluminar a noite obscurantista, devem também ser muito claros nas mensagens que fazem passar, falar uma linguagem de verdade e denunciar o estado das coisas, apontando metas e horizontes de esperança. Pacheco Pereira poderia muito bem ser uma dessas lições de espanto, não fosse a atribulada história e posições políticas que tem atrás de si, que o macula e fere na sua coerência e credibilidade ( mas só os burros não aprendem ).

Pois ele foi, no dia de ontem e ao arrepio de tudo aquilo que seria expectável, um dos apoiantes da conferência " das esquerdas " que se realizou na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa, cuja ordem de trabalhos assentava no reconhecimento do estado a que o País chegou e na possibilidade da esquerda convergir, congregar esforços e vontades para  acabar de vez com o austeritarismo imposto por este Governo, que está a levar o País à ruína e o povo à miséria. 
Tentando estabelecer pontes e compromissos  para   um futuro que se adivinha próximo, esta conferência foi promovida por um ancião emérito, de seu nome, Mário Soares, que conseguiu de forma inédita e após tantos anos, a façanha de juntar todas as forças políticas de esquerda, contando ainda com o apoio e contributo de outras personalidades , nas quais se incluia, entre outros, o destacado militante social democrata, Pacheco Pereira.
Muito embora liberal e militante do partido que está no poder, Pacheco Pereira é hoje um dos críticos mais acérrimos deste Governo, bastando ,para prová-lo, apreciar o já longo e tenaz libelo acusatório que ele vem fazendo aos governantes e à sua política, quer no seu diário digital e  nos jornais, quer em programas de debate televisivo - podemos dizer que os chamados intelectuais, apesar de  formados num sistema e dominados fortemente por ele,  não deixam contudo de combatê-lo, sempre que as suas convicções mais fundas sejam duramente atingidas , como parece ser o caso. Mas eu também sei que muitas vezes o perorar de Pacheco, podendo à primeira vista parecer descomprometido, eficaz  no juízo e na sentença, não passa afinal de retórica bem elaborada , senão mesmo comicieira e até panfletária, mais proxima da feira de vaidades , pela disputa do poleiro da fama, do que propriamente o da emanação arrebatada do defensor de causas puro.  Mesmo assim, descontando as vaidades e os anti-corpos que  Pacheco terá eventualmente contra Passos Coelho, por desfeitas , desencontros e sensibilidades outras, que  o poderiam ter levado facilmente à censura contra este governo,  quer-me parecer que, desta vez, a sua costela mais rebelde e maoísta calou mais fundo, fazendo com que ele mais uma vez descesse à arena política pura e dura para desancar sem medo nos poderosos e vociferar impiedosamente contra os males e as injustiças deste mundo.
Observando Pacheco ao longo dos anos nos areópagos políticos, o que se oferece dizer é que este cáustico orador e seviciador de políticos e  de políticas, passados já tantos governos e programas, parece conseguir, todavia, pelo menos desde que abraçou a causa social democrata, uma certa constância ideológica, às vezes com uma  tonalidade acentuadamente liberal, como no caso das críticas que fazia ao anterior governo, ou mais marcadamente social democrata, como parece ser agora o caso, conseguindo mesmo, em algumas ponderosas situações, ultrapassar pela esquerda o próprio partido socialista no duro e demolidor julgamento que faz ao governo, aproximando-se ironicamente das teses defendidas pelo PC e o Bloco de esquerda. Pacheco parece nunca se afastar do " locus da realidade ", é preciso, na verdade, combater os malandros que sujam a política, e que estão a provocar este dramático cortejo de morte e de miséria  que estamos a viver e a assistir.