quarta-feira, julho 30, 2014

Believe

CONNECT !!!


Penso que a fé continua ainda a ser uma das experiências mais significativas da vida das pessoas, senão mesmo o mais extraordinário catalizador homeostático da vida psíquica. A fé é a mais inteligente criação do imaginário humano, um opiáceo muito forte que visa aplacar o horror que irrompe das nossas entranhas. Este sentimento, esta adesão ilógica a um milagre reparador, capaz de mover montanhas e de apaziguar a angústia existencial, projectando a esperança e a salvação no âmago da tormenta, é um dos traços mais distintivos da condição humana. É por isso urgente e imperativo não o destruir, sob pena de cometermos por antecipação um trágico  suicídio - porque a verdade, ao contrário do epílogo inspirador do vídeo, já a sabemos todos.

segunda-feira, julho 28, 2014

Variações à viola

CONNECT !!!
Despacha o violão como despacha a panela O violão é o corpo, e o corpo o violão Namorando no braço do violão

domingo, julho 27, 2014

Relatório minoritário

CONNECT !!!
 " Por detrás do teatro está a vida, mas por trás da vida está novamente o teatro. Eu parti do imagionário e descobri o real, mas por detrás do real está novamente o imaginário ".
Para sobreviver ao cativeiro da existência o ser humano inventa estórias ( histórias ), estórias e mais estórias, verdadeiras ou falsas, tanto faz, porque o que é imperioso é matar o tempo para não perceber a oblívia inevitabilidade - o tempo da alienação. E as estórias são o enredo, os dramas da vida que se desenrolam no grande teatro do mundo, do qual fazemos parte, ou como artistas ou como espectadores , simultaneamente. Umas vezes, impantes e jocosamente deliciados, assistimos de camarote à tragédia dos outros; outras vezes somos nós, infelizmente, protagonistas agoniados de dramas sem remissão, para gáudio de uma plateia ávida de sensações. A ficção é, assim, a fórmula da sobrevivência para não soçobrarmos no turbilhão  da falta de sentido de tudo isto. Por isso nós construímos as nossas cabeças ( as nossas estórias ) à maneira daquele árabe que era fervorosamente crente, jejuava e nunca bebia álcool e cumpria todos os preceitos para alimentar a sua grande ficção, o seu "kit" de sobrevivência. Enfim, a narrativa que dava sentido à realidade. Mas parece que o pobre homem tinha uma fragilidade: a prostituição, que ele justificava alegando que o profeta também tivera cem mulheres. De facto, o temente não cedia na sua verdade mais básica: os instintos. Primeiro aquilo, depois a salvação da alma.
E assim é, na verdade, nós nunca paramos de representar, nem mesmo quando estamos frente ao espelho. Inconscientemente, a persona sobrepõe-se à nossa autenticidade , sendo o reflexo espelhar uma falácia, uma imagem conveniente que construímos para descanso e equilíbrio vital do nosso espírito. Daí que nem sempre seja fácil perceber o que se passa no eterno palco do mundo, que é feito de luz e de sombras, de pessoas de carne e osso e de máscaras, de grandes artistas e de impostores. Mas são tudo faces da mesma moeda. Todos nós somos assim, bipolares, todos nós enfermamos deste inebriante jogo de sombras. Umas vezes expostos em carne viva, outras vezes produzindo verdadeiras obras primas na arte de representar.
Na realidade, a natureza humana sempre foi muito plástica na sua expressividade, e por mais que as neurociências esgravatem em busca do cerne dos nossos pensamentos e da nossa intencionalidade, ele continua inviolável. Nenhum "Relatório minoritário" poderá, pois, devassar os labirintos do nosso legítimo território. Rastrear e vigiar as suas manifestações exteriores, á maneira de um "GPS" ou de um " Google Earth", é possível, como faz a psicologia do comportamento, mas desvendá-lo, nunca.

domingo, julho 20, 2014

Imagination

CONNECT !!!


As pessoas ficam muito mais clarividentes quando não estão ocupadas em ser inteligentes. Se o som tocou no nervo, não racionalizes, que estragas tudo. Frui !

segunda-feira, julho 14, 2014

Solipsismo

CONNECT !!!

De repente, fui invadido por um sentimento de pânico, uma asfixiante e intensa sensação de claustrofobia tomava conta de mim. Na realidade, sentia o meu cérebro a ser sugado por uma força atractiva imparável, como se uma bomba de vácuo instalada no âmago do meu ser estivesse a extrair-me da existência e com isso a provocar o colapso final. Este poderoso vórtice, escoando a uma velocidade vertiginosa, era constituído por um caldeamento de imagens, memórias, ideias, dúvidas e interrogações  que giravam estonteantes  em direcção ao lugar de nenhures, quiçá a sede da minha "infactualidade". Por várias vezes senti os pés a fugirem-me do chão, queria controlar a situação mas não conseguia, os meus gestos e a firmeza da concentração vacilavam a todo o instante, parecendo até que já não havia mais nada a fazer. O presente dividia-se agora entre um real imaginado e uma alucinação que se presentificava materialmente. Não sabia onde parava o ponto de equilíbrio de tudo isto. Talvez a  dose tivesse sido erradamente inflacionada, ou então o sonho do sonhador era inflado de vacuidade, embora fisicamente substancial. Por outro lado, a pressão e o esvaimento que sentia dentro da cabeça, acompanhado por um zunido estridente e contínuo como aquele que se sente quando se mergulha em apneia, não augurava nada de bom. E o coração, para concluir o quadro instável que resultava de todas aquelas manifestações e sensações,  dava também sinais preocupantes de alteração e  ritmo. Não suportava já tanta adrenalina à solta e pressentia que ia ser desligado a todo o momento. O campo visual encolhia, como se eu estivesse a distanciar-me do lugar e da circunstância e, agora, minguado, na sua periferia começavam a aparecer aquelas luminescências indiciadoras de um desmaio iminente. Por breves instantes balancei o corpo, que parecia agora uma nave desgovernada, e sucumbi ,estatelando-me com algum fragor no chão. 

Mas, na verdade, não..., não foi isto que aconteceu, porque  o que há de mais subversivo nesta espécie de simulacro que se auto-proclama de "ser humano", é a sua espantosa e despudorada habilidade para promulgar a sua própria existência. E a sua arrogância vai tão longe quanto o facto de inventar uma realidade que ele sente que o cerca e nela perceber padrões e regularidades que, afinal, são padrões e regularidades de coisa nenhuma. Enfim, de inventar uma memória cujo único fito é o de apenas autenticá-lo, de construir um eu para que o plano seja perfeito. Ou seja, esta máquina virtual, que julga produzir e instaurar sentido, ancorada, como se percebe, numa narrativa de devir imaginário, acaba depois por rematar todo este rocambolesco cambalacho ontológico com uma projecção final ,da ordem do sagrado e por isso transcendental, para sua eterna glória e salvação.


Mas, então, que cena é esta? Não estou a perceber rigorosamente nada?Preciso urgentemente de me situar. Existo ou não existo? E a realidade, o que é a realidade ? Também ela existe ou é apenas um simulacro, tal como eu ?
Bom, com efeito, a realidade é afinal esta , e apenas esta, a que está bem aqui , mesmo à nossa frente, nua e crua, preto no branco. Bastará apenas abrir os olhos e acordar. Com a breca!, basta de simulações e manipulações . Será que não conseguimos enxergar que estamos a ser dominados e alienados por uma crença ridícula ? Diz quem sabe que a fé , essa venda magnífica e a mais inteligente criação do imaginário humano, um opiáceo muito forte que visa aplacar o horror que irrompe das nossas entranhas, não passa de pura abjecção mental. Por consequência, acreditar em fantasmagorias poderá não ser o melhor caminho para a salvação. Acreditar que a realidade não passa de um sonho e que a materialidade do mundo é uma insidiosa abstracção, é cometer uma deplorável imprevidência - atira tu a cabeça com força contra uma parede e verás quão delicada é a óbvia realidade. A dor será enorme e a tua singela cabeça não ficará, com certeza, em muito bom estado.
Mas , atenção!, a dor só existe para que a ilusão se torne mais credível e melhor sucedida nos seus truques.
Em que ficamos, então?

quinta-feira, julho 03, 2014

Hipocondria

CONNECT !!!
INTERNET EXPLORER

Tenho para mim que a partir de uma certa idade, depois de passado, obviamente, o período do vigor e das patologias facilmente ultrapassáveis, as idas ao médico  passam a ser revestidas de uma gravidade inusitada, porque mais sérias e preocupadas, senão mesmo apavorantes e fóbicas. 

De facto, quer para cumprir o ritual de vigilância e despistagem habituais, através dos necessários "check-ins", quer por ingerência e temor infundido por algum sintoma ou sinal entretanto declarado e mal esclarecido, somado ainda ao peso nada negligenciável que uma ida ao médico representa sempre no nosso inconsciente, estas rotineiras visitas aos centros de saúde passaram a ser vividas e sentidas como um gesto estúpido de entrega voluntária no matadouro, um gesto de conformada resignação. 

Para além, claro está, do incómodo e da paciência que temos de ter para não sucumbir à teatralização da dor, sempre em cena nas salas de espera deste país. De facto, no íterim do atendimento e fazendo os possíveis por iludir a tensão com os pensamentos escapistas do costume, somos obrigados, impotentes,  a ouvir os sempre indesejados testemunhos cruciantes, uma ladainha de esconjuro que de todo dispensaria. Se de um lado é o desfiar de um rosário de sofrimento e martírio, enumerando-se o número de intervenções cirúrgicas já tentadas para debelar a doença, do outro é a condenação de um corpo em chagas, violentado praticamente em todo o seu território não sobrando nem uma tirinha a evidenciar saúde. E quando por fim, depois daquela provação toda, saímos definitivamente do purgatório, extenuados e completamente deprimidos, com um salvo conduto nas mãos onde não se lê a palavra provisório, dizemos para nós que foi a última vez .

Em boa verdade, mina-nos a ideia de que ao sairmos do consultório médico, depois de lá termos entrado cheios de força e a vender saúde, fatidicamente sairíamos com o destino já traçado: uma doença enterrada nos contrafortes de uma pretensa jovialidade seria por certo encontrada, tal como acontece num acto de Vodu para destruir inapelavelmente a vida de alguém. 


Na realidade, se até ali a nossa saúde e, naturalmente, a nossa vida sempre se pautou, pese embora alguns acidentes de percurso, pelo propósito irracional de vivermos em descontraída eternidade, ignorando a velhice como antecâmara da morte, não seria por certo uma simples análise ao sangue ou á urina que iria afectar a nossa crença, colocando-nos dramaticamente perante as intermitências de um holocausto vizinho. Mas não é assim que as coisas se passam, nem assim que funcionamos. Quando já atingimos  a fase da decrepitude, quando os amanhãs começam a ser mais escassos que os ontem(ns), começamos também a dar mais crédito à Filosofia e a  interrogar-nos sobre o sentido de tudo isto. E o acto médico, quer queiramos ou não, reconduz-nos atavicamente para a arena das nossas perplexidades, com a neguentropia a calar mais fundo - quando pressentimos a besta a expiar-nos, ficamos perdidos, hipnoticamente paralizados. 

Em resumo, somos refractários a tudo o que exponha a nossa melindrosa integridade. Alimentamos a  ilusão de vivermos em harmónica normalidade, resistentes a qualquer tipo de praga ou doença num gesto dilatório que dispensa qualquer sentença médica ou dúvida assassina. Nada poderá destabilizar o nosso solar e uterino quotidiano.

Não queria terminar, no entanto, sem reconhecer obviamente que é o nosso instinto de preservação que  empreende estas manobras de diversão para fugir à  inevitabilidade - ocultação, engano, negação e fuga. Todavia, não podemos fugir de nós próprios. Afinal, o outro, o outro do outro lado do espelho, aquele que me olha desconfiado, sou eu próprio.


A terapia